quinta-feira, 23 de junho de 2011

Gerson Borges



Conheci Gerson Borges e sua música há dois anos. Fiquei fascinado logo na primeira canção que ouvi. Este carioca carrega elementos musicais de várias culturas e partes do Brasil e consegue, como muito poucos, fazer uma arte quente, orgânica e extremamente rica. Cantor, compositor e poeta, suas letras saltam dos alto-falantes e quase tomam formas aos nossos olhos. É um dos raros artistas da música cristã brasileira que apresentam um grande conteúdo musical e literário e buscam um alto padrão em sua arte, coisa que todo “artista cristão” deveria fazer. Aliás, não costumo compartimentar música em gêneros. Apenas divido em duas categorias: a música boa e a música ruim.

A música de Gerson Borges trata de uma forma particularmente sensível das coisas do nosso mundo, nosso cotidiano, dilemas, sentimentos, e talvez por isso mesmo esteja em total consonância com os temas bíblicos e o que eles nos ensinam. Ele parece não segregar o “mundo espiritual” do “mundo secular” justamente por buscar Deus e a espiritualidade nas coisas simples que permeiam nossa vida, tudo isso com legítimo embasamento cristão. Sua música pode ser sintetizada em duas palavras: verdade e beleza. No mais alto grau.



Uma obra de Gerson a se destacar é “A Volta do Filho Pródigo”, musical inspirado na consagrada parábola contada por Jesus. Canções belíssimas como “Voltar pra Deus”, Sobretudo Quando Chove”, “Janelas” e “Dia de Festa” garantem a qualidade excepcional da obra, sem falar da poesia, que ora aperta ora afaga o coração de quem ouve.



Outra obra que merece grande relevância é “Nordestinamente”, que é um mergulho na cultura do nordeste. Neste disco Gerson revela um profundo respeito pelo universo e - inclusive pelo - indivíduo nordestino. Um carioca fazendo música nordestina poderia soar pretensioso, mas o talento do músico rende uma linda e honrosa homenagem a essa região que é grande berço da nossa cultura.O próprio compositor diz:

“Não sou nordestino - sou um carioca que aprendeu a apreciar a cultura, a arte, a música e poesia do Nordeste ouvindo o rádio com meu pai. Nos anos 70, nós sentávamos na varanda, o sábado indo embora, e ouvíamos o Projeto Minerva. Esse programa chamou muito a minha atenção curiosa de menino para as Cantorias de Viola, a mágica poética nordestina e sertaneja!”

Gerson Borges - Ave do Norte


Faixas realmente emocionantes como “Ser Tão Adorador”, “Ave do Norte”, “Se Eu Sou Poeta” e “A Chave é a Oração” tiram o fôlego, de tão belas.

Gerson Borges - Se Eu Sou Poeta


Sem chavões, fórmulas prontas ou jargões religiosos requentados, Gerson CRIA e não copia. Percebo as melhores influências possíveis em sua obra, como Lenine, Chico Buarque, Sérgio Pimenta, Ivan Lins, Luiz Gonzaga e outros. Mas percebo mais ainda uma forte identidade em sua arte. Um exemplo de como podemos “espremer” muito mais da criatividade que Deus dá ao homem e produzir com excelência.


(Obs: Os vídeos postados são slides feitos por usuários do youtube, e não video clips oficiais do cantor.)

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Pet Sounds


Esta semana está completando 45 anos o celebrado disco “Pet Sounds” dos Beach Boys. É uma boa oportunidade para os que não conhecem conferirem esta obra antológica e a mente inquieta e musicalmente insana de Brian Wilson (de preto, com cabelo de playmobil na foto acima), o líder e grande mentor da única banda que realmente fez frente aos Beatles nos anos 60. Foi por causa disso que comprei este disco quando eu tinha 16 anos (sim, eu sou beatlemaníaco). É um álbum que rejuvenesce e fica cada vez melhor com o tempo. Aliás, é impossível falar de “Pet Sounds” sem falar dos Beatles, pois suas discografias se relacionavam intimamente naquela época.

Na década de 60 a mídia alimentava uma rivalidade Beatles x Rolling Stones. Na verdade era uma “pseudo” rivalidade, pois o som das duas bandas não se parecia, tinham diferenças musicais bem visíveis. Inclusive eles eram bem chegados e sempre se encontravam (chegaram até a participar dos discos uns dos outros). Paul McCartney chegou a dizer que seus verdadeiros rivais musicais eram de fato os Beach Boys. O quarteto inglês tinha um profundo respeito e admiração por eles e sempre esperavam com grande expectativa e “temor” o próximo lançamento da banda californiana. Paul ainda diz que sempre considerou Brian Wilson um gênio e que os discos dos Beach Boys eram o parâmetro que eles tinham para melhorar a cada disco que lançassem. O mesmo ocorria do outro lado. Os BB – sobretudo Brian - ouviam os Beatles e se estimulavam a fazer algo no mesmo nível, ou se possível, melhor. Uma banda dava suporte e inspiração à outra. Foi uma rivalidade em que o vencedor foi justamente o público.

Em dezembro de 1965 os Beatles lançaram o excelente “Rubber Soul” e começavam a alçar vôos mais altos com relação a composição, arranjos, letras, e daí começaram a mudar o conceito de álbum, que até aquele momento era concebido como um apanhado de singles e canções avulsas reunidas. Brian Wilson disse:

"Eu realmente não estava completamente pronto para a unidade. Parecia que todas (as músicas) eram juntas. Rubber Soul era uma coleção de canções que de alguma forma eram juntas como nenhum álbum já feito antes, e fiquei muito impressionado. Eu disse, É isso. Eu realmente fui desafiado a fazer um grande álbum."

Então ele pôs sua mente genial para trabalhar no “Pet Sounds”. E trabalhou sozinho mesmo. Compôs todas as músicas (maioria em parceria com o letrista Tony Ascher), com exceção de “Sloop John B” (canção tradicional), bolou os arranjos e produziu o disco. Os demais membros dos Beach Boys apenas cantaram (Brian contratou músicos de estúdio para tocar). Inclusive o próprio Brian fez a maioria dos solos vocais, o que não era comum nos seus discos. Ou seja, foi um projeto pessoal de Brian, e que se difere radicalmente dos antecessores, na concepção, no som, no espírito, no propósito. Ele queria conceber uma obra de arte... e conseguiu. O álbum foi lançado em 16 de maio de 1966.

No Pet Sounds, ouve-se pela primeira vez instrumentos nunca antes imaginados numa banda de rock. Cravo, acordeom, instrumentos orientais como o koto e outras loucuras que hoje podem não assustar ninguém, além das sempre presentes harmonias vocais, que já eram marca registrada no som deles desde o começo da carreira. Brian dirigiu e regeu tudo na cabine de gravação e o resultado foi mágica pura!! Os outros integrantes acompanhavam tudo meio assustados, já que aquilo era bem diferente do que se esperava de um disco dos Beach Boys.

Wouldn't It Be Nice


Pet Sounds nos deu super clássicos como a vibrante faixa de abertura “Wouldn’t it Be Nice” e a belíssima e etérea “God Only Knows”, canção que Paul McCartney confessou querer ter composto. Aliás, este álbum deu continuidade ao ciclo “toma lá dá cá” entre Beach Boys e Beatles. Estes se sentiram tão desafiados com a obra prima da banda americana que criaram o tão famigerado “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” em junho de 1967.

God Only Knows


Costumo dizer que comparar os Beatles com os Beach Boys é meio injusto, apesar das duas bandas estarem praticamente no mesmo nível musical. O grupo inglês tinha três compositores absolutamente geniais (John , Paul e George) e ainda um senhor produtor (George Martin) que tornava realidade qualquer idéia sonora maluca que eles tivessem. Pois bem, os Beach Boys tinham um único gênio, Brian Wilson, que compunha, arranjava, produzia tudo e carregava a banda nas costas. Se houvesse pelo menos dois Brians na banda, sei não... os Beatles estariam em apuros! Pet Sounds veio para mostrar que os Fab Four não eram os únicos capazes de fazer do disco uma arte fina e também não eram tão absolutos no reino da música pop!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Graceland



Este é um daqueles grandes artistas que ficam meio esquecidos pelo público, mesmo tendo uma carreira bem sucedida e repleta de sucessos. Paul Simon é, sem dúvida, um compositor genial. Se eu fizesse uma lista dos 10 maiores compositores da música popular no universo pop/rock com certeza ele estaria lá, junto com Dylan, Lennon, McCartney e outros. Melodista notável, também escreve letras criativas, belas e profundas, talvez fruto de sua formação em literatura inglesa.

A primeira metade dos anos 80 ele passava por um certo ostracismo até gravar o fabuloso disco “Graceland” em 1986. Este, pra mim, é o melhor disco daquela década. Melhor que “Thriller” (Michael Jackson), “Joshua Tree” (U2) e “Brothers in Arm” (Dire Straits) juntos. Neste trabalho fantástico, ele mergulhou na música sul africana, gravou com artistas da África do Sul, cuja musicalidade fundiu-se perfeitamente com a sonoridade e idéias de Simon. O album foi aclamado pela crítica, recebeu vários prêmios e rendeu longo prestígio ao músico. Desde seus trabalhos em dupla com Garfunkel nos anos 60, Simon não apresentava canções tão inspiradas.

Graceland apresenta um trabalho instrumental e arranjos primorosos, e uma ousadia que acabou dando a Simon um reconhecimento como compositor de world music. Um grande destaque na sonoridade do disco é o baixo fretless de Bakhiti Kumalo, que fez poesia com seu instrumento. Solos e frases que arrebatam qualquer ouvinte que não entenda nada sobre contrabaixo. Só por isso o disco já valeria à pena. Mas há muito mais em Graceland. As guitarras são um dos pontos altos da sonoridade africana presente no álbum, juntamente com as percussões e toda a concepção rítmica. Um grande trunfo do disco foram vocais africanos, principalmente a participação do estupendo grupo vocal Ladysmith Black Mambazo em duas faixas, “Diamonds on the Sole of Her Shoes” e “Homeless”. Esta última, que é uma obra prima, acabou se tornando um hino contra o Apartheid na África do Sul.

Homeless


O disco começa apenas com acordes de acordeom seguidos por uma explosão de percussão na primeira faixa “The Boy in the Bubble”. A segunda faixa é a belíssima e grandiosa “Graceland”, que traz baixo e guitarras em destaques. “You Know what I Know” parece uma “La Bamba” africana, com um ritmo que faz qualquer um pular, e mais uma vez baixo e guitarras “saltitantes” e um exótico vocal de fundo. O disco conta com um grande hit, “You Can Call Me All”, que com seu apelo pop estourou nas rádios e ganhou um videoclip com a engraçada participação de Chevy Chase. “Under African Skies”, linda de doer, apresenta um dueto vocal de Simon e Linda Ronstatd.

You Can Call Me All


Apesar da sonoridade típica norte-americana dos anos 80, Graceland apresenta canções universais e arranjos atemporais. O fato de Simon ter buscado o diálogo cultural com a África do Sul em meados daquela década foi de uma importância que transcende a área musical. Todos os olhos se voltaram para aquele continente e sua então realidade. Não foi à toa que o álbum abocanhou todos os prêmios possíveis. Então se você ainda não ouviu, não morra sem ouvir – várias vezes – esta obra prima.

The Boy in the Bubble

domingo, 20 de março de 2011

Discos: ainda valem a pena?

Você ainda continua a comprar discos (ok, CDs no caso)? Aposto que, como a grande maioria, deixou de comprar ou compra raramente. O preço não tem compensado, e a facilidade de ouvir e baixar tudo o que se quer na internet nos afastou desse objeto fascinante. Outra pergunta: Você ouve CDs inteiros ou apenas músicas avulsas dos seus artistas preferidos? Eu, particularmente, adoro álbuns. Ainda sou da época do LP. Costumava segurá-los o tempo todo, sentir a textura dos sulcos, explorar a capa, contracapa, encarte e interior, quando tinha capa dupla enquanto ouvia faixa por faixa, percebendo a relação entre cada uma e os contrastes entre elas. Claro que nem todos os discos tinham esse conceito de soar inteiros como uma obra homogênea. Mas eles tinham umas “sacadas” que instigavam seus ouvintes.

Com a pirataria fora do controle no Brasil, os álbuns (CDs, outrora LPs) se rebaixaram a um mero item no cartão de visita do artista, pois já não têm mais a força que tinham há poucas décadas. Hoje é muito difícil achar um disco que nos faça sentar na poltrona e ouví-lo inteiro. Antigamente, um cantor/compositor e as bandas elaboravam seus álbuns como um escritor concebe um romance. Não eram para ser ouvidos em parte, uma música ou duas, mas toda a obra. Aliás, muitos discos mostravam conceitos e idéias que não poderiam ser atingidas ouvindo-se apenas pouco mais que uma faixa.

A relação ente o artista e o álbum também mudou muito. Podemos perceber que os caras investem em um ou dois hits para saturarem na mídia e o resto do disco é pura “encheção de lingüiça”, idéias repetitivas e material da mais completa mediocridade. Isso vem acontecendo até com ótimos músicos que outrora gravavam discos brilhantes. Dificilmente encontro cantores/bandas em atividade cujos CDs sejam realmente interessantes.

Falando-se especificamente em música popular, a idéia de disco como obra de arte ou conceitual começou nos anos 60 com os Beatles, Bob Dylan, Beach Boys, The Who e outros. Nessa época houve de fato, grandes acontecimentos mundiais de ordem social, política e o escambau. Com isso veio uma explosão de criatividade nas artes, o que acabou “contaminando” também a indústria fonográfica através de músicos inspirados, que queriam criar o máximo e fazer nada menos que a melhor música que podiam. A tecnologia também avançava dentro dos estúdios de gravação. Como um efeito dominó, aquela geração influenciou as gerações posteriores e o saldo em 50 anos foi de muitas obras primas em formato de bolacha de vinil e CD.

Atualmente não se produz discos tão bons como há trinta ou quarenta anos, porque o artista quer em primeiro lugar ficar rico e famoso. Aliás, qualquer criatura, seja músico ou não, pode gravar um disco, ao mesmo tempo em que o público se torna cada vez menos "exigente" com a qualidade musical. A música pode ser no máximo... digerível. Aliás, as palavras “artista” e “músico” têm sido muito maltratadas e mal empregadas. Além disso, a figura do produtor ganhou quase mais destaque do que o próprio artista. O mercado crescente de música em formato digital também enfraqueceu o gosto pelo disco. E é claro, a kryptonita dos álbuns, a pirataria, que no Brasil encontrou milhões de aderentes e incentivadores (milhões de criminosos na verdade). Uma pena e vergonha para nós.

Eu mesmo não tenho adquirido CDs com a freqüência de antes. Mas sempre que encontro um que valha a pena, compro com muito gosto, ainda que ele esteja disponível para download gratuito nos blogs. Fotos, informações e ficha técnicas, textos, e a arte gráfica são coisas que me seduzem. Apreciar e folhear tudo isso entre os dedos é um prazer pra mim. Concordam que há uma enorme diferença entre ver uma bela pintura no monitor do computador e ter a mesma tela pendurada na parede de sua casa?

quarta-feira, 9 de março de 2011

Arte: apreciada ou consumida



Um dia desses, ouvindo rádio no carro e mudando de estação toda hora – mania minha – percebi a avalanche de gêneros e estilos musicais que são despejados em nossos ouvidos diariamente. Nem é preciso ligar o rádio pra perceber. Basta ligar a TV, ou navegar na internet. Somos expostos a uma confusão sonora (poluição muitas vezes) e vamos absorvendo tudo isso. Em meio a este fato, eis que surgiu uma pergunta, ou melhor, algumas: O que chamamos de “arte” hoje? É pra ser apreciada permanentemente ou consumida como uma lata de sardinha? Existe “arte descartável”?

O questionamento veio porque numa estação de rádio eu ouvia “Águas de Março” de Tom Jobim, e depois mudei de estação e ouvi a mais recente música de trabalho do rapper 50 Cent. Depois mudei de novo e ouvia “Uma pequena Serenata Noturna” de Mozart, e depois em outra rádio, o pagode baiano “Liga da Justiça”. Quanta informação diferente. Um verdadeiro “ecossistema sonoro”. Bom, não há dúvidas de que tudo que eu ouvi é música (deixemos o preconceito de lado).

O que difere uma música de outra, para que uma seja sempre lembrada ao longo do tempo e outra, morta e enterrada para sempre? Processos de composição diferentes? Inspiração de mais ou de menos? Intenções diferentes? Formação musical acadêmica? Ora, muitos gênios da MPB nunca estudaram música. E muitos Doutores em música não conseguem compor um compasso que agrade a qualquer ouvido humano.

Quando ouço e vejo o Justin Bieber, não duvido que ele tenha algum talento. Mas ao mesmo tempo lembro do grupo Menudo nos anos 80, do grupo brasileiro Dominó (lembram?), e do New Kids on the Block. Tiveram grande êxito e causaram grande impacto e histeria em suas gerações de adolescentes. Pra onde foi todo aquele sucesso? Por que suas músicas não tocam mais nas rádios hoje? Por que aqueles fãs adolescentes (hoje já crescidos, lógico) não ouvem mais aquelas músicas? Não acho que este mistério está no talento ou falta dele. Até porque o guri Justin Bieber certamente tem, apesar da superficialidade musical do produto que leva seu nome. Se ele for mais esperto do que os astros infanto-juvenis de outras épocas, vai criar asas, ficar independente, se desenvolver e fazer algo mais consistente para o bem de todos (inclusive dele). Caso contrário, vai cair no limbo do esquecimento e virar uma piada, uma caricatura de uma época, como aqueles astros esquecidos que citei.



Hoje em dia está em voga o “artista miojo”, sucesso instantâneo. Já é um estouro antes de qualquer pessoa ouvir uma música sua sequer. Como assim? A que se deve o sucesso meteórico de alguém que mal se lança na carreira? Aos óculos que usa? À calça laranja e ao cabelo “estiloso”? A imagem do artista, como ele se veste, onde ele anda e com quem, como se comporta... tudo isso é mais importante do que sua “arte”. Isto é o que os meio de comunicação deixam transparecer.

Esses dias, também vi uma lista dos “100 maiores artistas de todos os tempos” promovida pela emissora de TV norte americana VH1. Os “eleitores” foram grandes astros das música pop atual, que listaram os artistas de sua preferência em ordem de importância. Em 1º lugar deu Beatles, disparado! Eu, que sou beatlemaníaco, não achei nenhuma surpresa. Mas foi curioso ver que a grande maioria dos artistas que votaram nem era nascida quando os Beatles terminaram. Inclusive muitos com menos de 30 anos de idade. O que alguns artistas ou músicas têm para durarem tanto e serem sempre atuais enquanto outros duram no máximo um verão? Talento seria uma boa resposta, mas não é a única. O rapper Jay-Z (!) disse que “uma grande música não tenta ser nada – simplesmente é”. Não é o número de vezes que vai tocar no rádio ou na novela que fará dela uma canção memorável. O alto consumo não dá crédito ou valor artístico a uma música. Dá valor de mercado, cifras. Isso é outra coisa.

Posso dizer então que há músicas e artistas que são apreciados e outros que são meramente consumidos, assim como as telas de Picasso no museu e o jornal que compramos há três dias jogado no depósito, respectivamente. Com música é assim também – pelo menos de algumas décadas pra cá é assim. Daqui a dez anos você vai ouvir com mesmo prazer e naturalidade o que ouve hoje? Por que ouvir “Like a Virgin” (Madonna) hoje soa tão datado, ultrapassado? É uma canção dos anos 80. E porque quando toca “Revolution” (Beatles) no rádio a maioria dos ouvintes – de qualquer idade - pára pra ouvir? Trata-se de uma gravação de 1968.



Assim como uma grande música, um grande artista não tenta ser – simplesmente é. Há grandes astros por aí que são tentativas, são blefes que se sustentam por muita maquiagem, roupas (ou falta delas), escândalos, caras e bocas. Artistas que precisam desesperadamente de um sucesso após outro, de hits sucessivos nas paradas, de uma notícia na revista, de se adequarem à moda corrente, se não serão esquecidos. Porque sua arte não sobrevive sozinha, já “nasce morta”, não tem nada que permaneça na lembrança das pessoas.

Como talento não se compra, gastam-se fortunas em estratégias de marketing e promoções. Isso para dois anos depois ninguém lembrar de nada. Morto, enterrado e esquecido para sempre. Dá-se mais importância à figura do artista do que à sua arte. Pode parecer uma comparação esdrúxula, mas no século XVIII Johann Sebastian Bach (1685-1750) não tinha produtor ou empresário, não havia rádio nem tv. Pois bem, ele é tocado até hoje nas rádios e salas de concerto e tem músicas conhecidas até do público leigo em música erudita. Entre os vários motivos pra que isso tenha ocorrido, devo dizer que sua música é reconhecida e apreciada como uma obra de arte, que sobrevive sozinha, que é viva. Não é um mero produto a ser consumido com prazo de validade para uma faixa etária específica. Não é preciso fazer música clássica para se conseguir isso. É simplesmente música boa e irrestrita, desapegada de épocas, para todos, em qualquer tempo ou geração.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Phil Keaggy



Há poucos anos descobri um músico fabuloso dos Estados Unidos. Seu nome é Phil Keaggy. Cantor, compositor, guitarrista/violonista com rara habilidade. Nascido no estado de Ohio em 1951, Phil Keaggy tem uma legião de fãs no mundo inteiro, inclusive entre músicos famosos. Um fato curioso marca a carreira dele: A ausência do seu dedo médio na mão direita, perdido num acidente com uma bomba d’água quando ele tinha 4 anos de idade. Isso não o impediu de começar a aprender guitarra quando tinha dez anos. Tocou em algumas bandas na adolescência, quando formou o trio Glass Harp, obtendo algum reconhecimento local. Com essa banda, ele gravou no estúdio de Jimi Hendrix, quando tinha entre dezoito e dezenove anos. Depois começou a correr uma lenda em que Hendrix, ao ser perguntado sobre “qual a sensação de ser o maior guitarrista do mundo” teria respondido: “Não sei, você tem que perguntar isso a Phil Keaggy”. Phil até hoje rejeita essa história.

Glass Harp no início dos anos 70 (Phil na guitarra):

Ao longo de toda a carreira ele tem lançado discos de qualidade e talento inquestionável. O que muito impressiona em Phil Keaggy é a capacidade de transitar por vários estilos com maestria. Domina tanto o violão acústico quanto à guitarra elétrica com a mesma habilidade. Em muitos trabalhos ele lembra muito o som de Paul McCartney. Sua voz num momento lembra a do ex-beatle, noutro lembra a de Russel Hitchcock, do Air Supply.

Lançou seu primeiro disco solo “What a Day” em 1973, e desde então foram mais de 50 discos gravados, fora as colaborações em trabalhos de outros artistas. Na obra instrumental são muito relevantes os discos “The Master and The Musician”, “Beyond Nature”, “220”, e “Freehand”.

Phil, no fim dos anos 70:

Com ou sem banda acompanhando ele é um show man. Aliás, ele nem precisa de banda. Com o domínio de vários recursos e efeitos de pedal ele faz a percurssão e todas as partes da guitarra ao mesmo tempo, criando uma sonoridade incrível.

Phil Keaggy é um músico bastante premiado, e é uma pena que no Brasil muito pouca gente o conheça. Vale a pena pesquisá-lo, tanto em sua obra instrumental como em seu trabalho como cantor.


sábado, 26 de fevereiro de 2011

Alex Cuba


O nome do cara é Alex... Alex Cuba. O país de onde vem? Bom, o sobrenome dá a dica infalível. Sim, o rapaz vem da “ilha de Fidel” nos bombardear com um som irresistível, e parece ter saído do elenco de Hair, por causa do visual Black Power, com direito à costeletas praticamente entrando pelos cantos da boca. Conheci essa figura em Las Vegas, na cerimônia do Grammy Latino 2010, ao qual ele foi indicado em uma ou mais categorias com seu terceiro disco simplesmente intitulado “Alex Cuba”, lançado naquele ano.

Cantor e compositor, nasceu Alex Puentes, em Artemisa, Cuba, em 1974 e desde criança começou a se envolver com música. Chegou a estudar guitarra, percussão e contrabaixo oito horas por dia, na adolescência. Casou-se em 1999 com uma canadense e foi-se embora para Canadá. Apesar de carregar Cuba no sobrenome, o músico não é preso à tradições da música de seu país. É um vanguardista. Sua música é marcada pelos ritmos latinos misturados à guitarras roqueiras, pop, Black music norte americana e melodias doces, o que subverte o conceito de música cubana pura.

Em 2006 gravou seu primeiro disco solo “Humo de Tabaco”, ainda com um som bem acústico e mais latino, marcado pelos violões, piano, percussões e arranjos de orquestra. Este disco ainda traz a participação vocal de Jason Mraz na canção Dramatica.

O segundo disco “Agua Del Pozo” veio em 2008. Em meio às percussões latinas já começa a brotar um som mais Black norte americano na bateria e nos arranjos de metais. A guitarra elétrica também começa a dar o ar de sua graça. Tudo acontecendo com extremo bom gosto.

Em 2010 ele lança cd homônimo, com os ritmos latinos, o pop e o soul muito bem dosados. Faixas irresistíveis com forte apelo pop como If You Give me Love e Ella, Um baião “disfarçado” em Caballo, a ótima balada romântica Solo Tu já garantem a qualidade deste disco, que rendeu ao artista o Grammy Latino de melhor artista revelação.


É fato que a fórmula de Alex Cuba deu muito certo. Longe de ser um “latino-pop” descartável, sua música traz referências de vários lugares do mundo. Uns dizem que é “latin soul”; outros, que é “pop fusion”, ou até mesmo “world music”. Enfim, ficar tentando rotular o som desse cara é bobagem. Chame como quiser, a música de Alex Cuba é boa demais. Seus discos, bem produzidos e arranjados com muita sensibilidade, mostram que estamos diante de um excelente músico que trilha sua carreira com muita personalidade, sem se importar com modas ou tendências ao seu redor.